Terminado o jantar (um belo ensopado de ossos, especialidade de Mordor) os heróis mostraram-se todos muito atarefados e cheios de pressa!
- Tenho de ir já terminar um poema! – disse Aegnor.
- E eu de ir falar com a minha espada – acrescentou Mormegil – ainda não lhe disse nada hoje.
- Acabei de me lembrar que ainda não terminei o texto de Quenya! – exclamou Olorin o Maia. – Estou desejoso de o terminar!
- Eu tenho de ir ver se os meus machados estão afiados! – disse Azaghal.
- Também tenho de… - começou Mestre Elrond, mas foi interrompido por um murro na mesa do Daedhel.
- Nada disso!

Vão todos já para o meu laboratório! Tenho de ver esses ferimentos!
- Mas eu ainda não… - começou a Maharet, mas calou-se ao ver o olhar do Daedhel.
- Devo concluir que os grandes heróis estão todos cheios de medo???
- Claro que não!

Quem, nós???
- Imaginem! Nós??? Mas… onde é mesmo esse laboratório??? – perguntou Theoden.
- Insisto em ser o primeiro - disse o Anglachel, com um ar de dignidade ofendida.
- Então vamos! – e lá seguiram para as caves da fortaleza, bastante contrariados e arrastando os pés! Pararam todos à porta do laboratório, muito nervosos enquanto o Daedhel a abria.
Entraram curiosos, e estacaram ante o que viram!
Era uma sala grande onde se viam estantes com livros, alguns apontamentos e prateleiras com MUITOS frasquinhos contendo fígados, olhos, corações ainda a pulsar e muitos cérebros, entre outros órgãos. Penduradas pela sala havia umas jaulas com cadáveres lá dentro, ainda com alguma carne agarrada mas esta já seca, um grande caldeirão contendo algum unguento borbulhava e a um canto via-se uma guilhotina. Havia umas mesas e umas cadeiras com correias, e uma bancada onde se viam sovelos, pregos, brocas de vários tamanhos, berbequins, machados, serras, tesouras, bisturis e uma série de instrumentos estranhíssimos.
- Porque é que aquelas mesas e cadeiras têm correias? – perguntou o Eru.
- É para prender os doentes, se eles não estiverem sossegados!
- Eu já me sinto
MUITO MELHOR! – disse Azaghal.
- Eu também, praticamente já estou bom! –exclamou Mormegil
- Aquela comida de ossos faz maravilhas – acrescentou Aegnor – sinto-me como novo!
- Nunca me senti tão bem! – afirmou Théoden.
- Parem todos com essas
fitas! – disse Daedhel muito zangado, e accionou a guilhotina. Viu-se uma grande mancha vermelha e ficaram todos muito pálidos.
- Bem, isto afinal é uma coisinha de nada – garantiu Anglachel, aproximando-se da porta – um arranhãozito sem importancia, mal se vê o osso e...
- Bolas, nunca mais acerto com o tamanho para as fatias de melancia – resmungou Daedhel, enquanto apanhava um bocado realmente grande do fruto e o voltava a colocar na guilhotina. Ouviram-se vários suspiros de alívio! – Mas vocês estão muito pálidos: tenho de vos dar um fortificante! – e distribuíu por todos uma mistela de sabor horrível.

Houve muitas caretas mas ninguém refilou, com medo do tratamento que ainda estava por vir.
- Anglachel, então? Vou ter de te anestesiar para te sentar? – e o Daedhel agarrou numa grande marreta.
- Pronto, está bem, eu sento-me! – lá concordou o Anglachel, vendo que não tinha escapatória – mas agulhas não.
- Mas como queres que eu te cosa sem agulhas? – perguntou Daedhel, vindo com uma enorme! – Vamos, fecha os olhos e pensa nalguma coisa de que gostes. E eu ponho primeiro um líquido para te adormeçer um bocadinho o braço.
O Anglachel fechou os olhos com muita força enquanto o Daedhel o tratava.
“Au! Arde!!!” – gritou, quando ele lhe passou com um líquido qualquer sobre a ferida, e para se animar pensou naquela tarde inesquecível na Sala de Torturas, em que ele e a Senhora Negra ouviram maravilhados a Gwen cantar! Quem estava muito chocado com o que via era Mestre Elrond, que observava horrorizado a sutura que o Daedhel fazia.
Depois de terminar e de ligar cuidadosamente o braço do Anglachel, estavam todos muito pálidos.
- Agora tu, Théoden! Tens vários cortes que têm de ser tratados e desinfectados! Senta-te!
O pobre Théoden lá se sentou a tremer, e estava numa tal aflição que só pensava:
“se me livrar desta, cubro a Gwen de amendoas! Cubro mesmo, e não dou só aquelas poucochinhas que eu digo para a contrariar” – prometeu a si próprio, e quando finalmente acabou o tratamento sentiu um grande alívio. Tinha diversas ligaduras e os outros tinham vontade de rir quando olhavam para ele, mas passou-lhes logo a vontade quando ouviram o Daedhel dizer
“O próximo!” e como ninguém se mexeu e começaram todos a olhar para o lado, teve de ser mais enérgico.
“Vamos, Elrond, tens bastantes cortes e esse aí na cara é grande.”
Mestre Elrond sentiu-se desfalecer!
– Mas Daedhel, eu sou de opinião que devias ter primeiro umas aulas de costura em Rivendell... – começou por dizer, mas quando o viu ir buscar um bisturi calou-se logo.
- Posso fazer uns golpezinhos para a costura ficar com um ar mais élfico… - sugeriu Daedhel, ao que Elrond respondeu que não valia a pena, mas que se mantinha a oferta das aulas. Muito infeliz, Mestre Elrond só pensava que se sobrevivesse ao tratamento e encontrasse a sua filha, far-lhe-ia finalmente a vontade e tirariam juntos uma foto com muitas rendinhas, como ela tanto desejava, para a capa da Caras-Galadhon. Ela ficaria toda contente e as rendinhas sempre serviriam para tapar todas aquelas ligaduras e costuras, ia pensando ele –
Au! Cuidado!!! Seguiu-se o pobre Olorin, que pensava saudosamente nas chicotadas da Mellon e prometia a si próprio nunca mais discutir com o outro Olorin, quando abriu os olhos e lhe pareceu ver alguma coisa a materializar-se no meio da sala; pensou que afinal estava
muito pior do que imaginava
(ou então era do tratamento), mas quando voltou a olhar pareceu-lhe ver a figura de Saruman;

mas estava estranha, como se não fosse real mas apenas um fëa tomando uma forma visível; assustado, disse:
“Está ali alguém” e todos olharam. Na verdade, a figura de Saruman tomava forma e parecia flutuar no meio do laboratório. Olhava-os fixamente e por fim disse, com uma voz poderosa mas parecendo vir de longe:
“Sim, é o meu fëa e foi-me permitido voltar, pois tenho algo importante para vos dizer.
Há muito tempo, quando ainda estudava a tradição dos Anéis do Poder, descobri um antigo livro Noldorin, com o título “Quentulessë Morion” – “Lenda do Regresso do Escuro”, que fala duma estranha Profecia: os Três Anéis Élficos juntos com um quarto objecto tinham o poder de abrir as Portas da Noite, havendo assim o perigo de Morgoth voltar. Então, os Elfos criaram um contra-feitiço para inverter essa magia: uma frase poderosa, composta por quatro palavras, em que cada uma está ligada a um dos objectos. Temendo que estas informações caíssem nas mãos erradas, codifiquei essa frase na forma de quatro Desafios, que estão escondidos em Isengard; depois de resolvidos, cada um revela uma palavra do contra-feitiço que fecha as Portas da Noite. O primeiro desafio codifiquei na Porta de Orthanc: terão de o resolver para entrar na torre e ler o antigo livro Noldorin; ficarão também a conhecer o simbolo que terão de procurar para descobrirem os outros desafios. Quando conhecerem todas as quatro palavras, terão de resolver um anagrama para a frase ficar na ordem correcta e assim ser eficaz. Há no entanto um problema: um dos esconderijos foi violado, penso que por um dos Nazgul. Terão de calcular qual é essa palavra, a única que está na mão do inimigo.
Pois os Três Anéis Élficos desapareceram, não é assim? Vê-se pela forma como as estrelas se movem no céu, o momento da profecia aproxima-se! Se não querem que o Inimigo Negro volte e as Trevas dominem a Terra Média, vão a Isengard e resolvam os desafios. Vão, o tempo urge!”E desapareceu! Ficaram todos muito sérios a olhar uns para os outros e a Evenstar esfregou os olhos.
- O espirito de Saruman esteve mesmo aqui? Não sonhei? Falou duma antiga Profecia dos Três Anéis e do regresso de Morgoth?
- Sim, e que esse livro estava na Torre de Orthanc e era a chave para se resolver este mistério! O que acham? Será uma armadilha para nos afastar de Dol Guldur? – perguntou o Eru – Saruman não era de muita confiança, para o fim...
- É verdade, mas muitas coisas batem certo com o que ele disse. Se os Três estão mesmo a ser usados com o propósito de abrir as Portas da Noite, o caso é mais grave do que imaginávamos – argumentou Maharet – e nesse caso, temos de saber bem com o que estamos a lidar!
- E dando crédito às palavras de Saruman, temos 4 desafios para resolver, e cada um revelará uma palavra do contra-feitiço que temos de usar para inverter o processo – disse Mormegil.
- Três, pois parece que um foi roubado – acrescentou Aegnor.
- E o primeiro desafio é o da Torre de Orthanc – continuou Theoden – se resolvermos esse desafio, ficamos com uma das palavras e conseguimos entrar na Torre.
- E ficamos também a conhecer o símbolo que temos de procurar para encontrar os Desafios. – disse Azaghal.
- Depois temos de descobrir o antigo livro que fala dessa Profecia, o
Quentulessë Morion - acrescentou Annawen. - Penso que Morion é um dos nomes porque Morgoth foi chamado, o
Filho Escuro.
- O quarto artefacto deve ser o que roubaram aos Elfos de Mirkwood! – exclamou Bijuca – As coisas parecem bater certo! E agora, o que fazemos?
- Talvez fosse melhor irmos já para Orthanc – disse Daedhel – Damos uma vista de olhos, e se não se passar nada por lá, ficamos a saber que foi falso alarme e seguimos para Dol Guldur. Mas é melhor verificar.
- Concordo plenamente em partirmos já! – exclamou o Olorin, levantando-se logo da cadeira e tudo –
Não percamos tempo, o caso é muito grave! – e com a pressa até tropeçou na ligadura da perna que estava mal presa e se arrastava pelo chão.
O Daedhel ainda ia a protestar que não tinha terminado os tratamentos, mas os outros pareciam cheios de pressa e decididos a partir sem demora, principalmente o Azaghal, Aegnor, Mormegil, Bijuca, Eru, Maharet, Annawen, Evenstar e Olorin, que nem queriam acreditar na sua sorte e que se tinham livrado dos terríveis curativos.
- Mas então eles não terminam o tratamento? – perguntou Anglachel, muito aborrecido por se ter oferecido para ser o primeiro.
-
Isto é mais grave! Vamos, a minha espada? – Ouviram-se várias vozes.
- Concordo! O meu machado? Vou já buscá-lo!
- Sim, partamos então sem demora!

– concordou por fim o Daedhel – os casos mais graves já estão tratados! Vamos então para Orthanc! – e ouviram-se vários suspiros de alívio – e pelo sim pelo não, levarei uma malinha com algum material para primeiros socorros…
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